– Adoração: um termo muito mal-interpretado hoje e há muito tempo.
– No AT era sinônimo de holocaustos, ofertas de manjares, ofertas de animais, de bezerros de um ano, sacrifícios, votos, o ruído das vozes e cânticos, harpas, liras, etc.
– Por meio dos profetas, Deus já havia rejeitado tudo isso e pedido uma só coisa:
“Que corra o juízo como as águas e justiça como rio que não seca” (Am 5.24).
“Pois misericórdia quero, não sacrifício, e o conhecimento de Deus mais do que holocaustos” (Os 6.6).
– Uma coisa não faz o menor sentido sem a outra: o holocausto puro, sem a prática da justiça, os votos de devoção, sem o exercício da misericórdia.
– Hoje a igreja trilha os caminhos da adoração: da indústria da adoração (Cd’s, mercado, marcas), do movimento de adoração (“ministérios”); e das escolas de adoração (profética, extravagante, do Santíssimo, íntima, com chuva, sem chuva, diante, de costas, embaixo ou cima do trono).
– Parece que o fio condutor dessa adoração são as formas, e não o Espírito e a Palavra.
– Fórmula: irracionalidade = intimidade = adoração (“É proibido pensar”, João Alexandre).
– O texto de Apocalipse 5 nos oferece algumas pistas para pensarmos a adoração bíblica:
1. A adoração é propiciada pela Graça (v. 1-5)
– Elementos da visão: Deus, trono, vinte e quatro anciãos, quatro seres viventes, legião de anjos, e, mais abaixo, a criação.
– Havia um livro (rolo) na mão direita do que estava no trono, escrito por dentro e por fora e selado com sete selos.
– Pergunta crucial: Quem é digno de abrir o livro e desatar os selos? (v. 2).
– Dignidade = merecimento ou honra. Aqui tem a ver com autoridade distinta para…
– Em nosso mundo, trabalhamos muito com a noção: digno, honrado ou não para… E todos querem ser achados “dignos” para ocupar determinado cargo, realizar certa tarefa, ser colocado entre aqueles que estão apto-aprovados a… E a religião reforça isso!
– Mas, para a tarefa de abrir o livro (a revelação), ninguém havia sido digno (v. 3).
– E João chora o choro amargo da indignidade, do desespero, pois ninguém poderia romper o lacre (v. 4).
– Fim do choro: o Leão de Judá que venceu para abrir o livro e o Cordeiro que foi morto comprando-nos com seu sangue para Deus (v. 5-6).
– Em que isso muda nossa perspectiva da adoração especificamente?
– Não somos nós quem propiciamos a adoração, mas é Deus; não somos nós quem o atraímos, Ele quem nos atrai; não somos nós que o agradamos, mas o sacrifício do Cordeiro: Está consumado!
2. A adoração tem um centro: Cristo, o Cordeiro (v. 6-10)
– Quando o Cordeiro tomou o livro, todas as atenções voltaram-se para Ele (v. 6).
– A visão de João: Ele se encontrava no centro, no meio do trono e entre os seres viventes.
– Ato simbólico da redenção: Ele toma o livro da mão direita “daquele que estava assentado no trono” (v. 7).
– Dele, por Ele e para Ele são todas as coisas. Daí provém um “novo cântico”:
“Digno és de tomar o livro e de abrir-lhe os selos, porque foste morto e com teu sangue compraste para Deus os que procedem de toda tribo, língua, povo e nação e para nosso Deus os constituíste reino e sacerdotes; e reinarão sobre a terra” (v. 9-10).
– Cristo é o centro da adoração: 1º porque do ato redentor provém a adoração; 2º porque todas as coisas convergem para Ele.
– Por isso, numa adoração cujo centro parece ser o “eu”, temos um sério problema.
(“Eu vou seguir com fé”, Kleber Lucas).
– A adoração pela graça produz em nós uma convergência de olhar: o ego deixa de ser o centro, como o pecado fazia supor, e Cristo é quem ocupa esse lugar.
3. A adoração reúne todos em torno desse centro (v. 11-14)
– Ela deve promover uma re-união: de vozes, de almas, corações e mentes que celebram a vitória do Cordeiro e a dignidade restaurada (v. 11). E todos cantam: “digno é” (v. 12).
– Dimensão comunitária da adoração – não segrega, mas une em Cristo: “Mas, agora, em Cristo Jesus, vós, que antes estáveis longe, fostes aproximados pelo sangue de Cristo” (Ef 2.13).
– Não significa abolição das diferenças, e sim, criação de um espaço comum, onde as diferenças são celebradas, ao mesmo tempo em que se partilha uma fé em comum, que procede de e converge para um centro em comum, que é Cristo, a Cabeça.
– A adoração em Apocalipse remete a uma reunião (v. 13). Ela não suprime a dimensão pessoal (quatro seres, 24 anciãos, anjos, homens, criaturas), mas complementa a pessoalidade.
– Preste atenção: é Cristo quem promove em mim e em você uma metanóia. Mas a pessoalidade nele (identidade), bem como a adoração, só pode ser completa se, e somente se, houver uma sinergia e união de diferentes, que são igualados Nele.
Conclusão:
– Termino dizendo que a adoração é e deve ser uma múltipla afirmação:
1. Afirmação de Deus ao Cordeiro que foi morto, e que, por isso, triunfou sobre a morte, espalhando vida eterna e abundante.
2. Uma afirmação da Graça de Deus, que faz daquilo que era impossível a nós, ser plenamente possível. O livro está aberto para que reescrevamos dia após dia nossas histórias de vida, sendo afetados pela Graça de Deus.
3. E é, por fim, segundo Eugene Peterson, a nossa afirmação ao Deus que nos afirma. “Ele diz sim, e respondemos a isso com um outro sim, amém”.
“Àquele que está assentado no trono e ao Cordeiro, seja o Louvor, e a honra, e a glória, e o domínio, pelos séculos dos séculos” (v. 13).