A igreja será apenas uma instituição humana se não tiver a visão de Jesus Cristo para o contexto e a realidade histórica na qual está inserida.
Mateus 26.17-30
Falar dos objetivos da igreja em contraposição as megatendências da pós-modernidade e o modismo quanto a quebra de paradigmas que resultam na perda da identidade doutrinária, do mundanismo que gera a mundanalidade incrustada na igreja pela relativização da ética cristã, arrefecendo a autoridade da igreja em sua ação reformadora no mundo, Efésios 3.10.
A igreja deve interagir na história, não andar a reboque da historieta escrita nos alfarrábios desta geração corrompida e perversa. Somos o povo do Deus que é Senhor da história e que se manifesta através da história. A igreja é manifestação de Deus na história. Não podemos nos contentar em causar impacto na história com os nossos escândalos ou com a nossa inércia contemplativa enquanto o céu não vem. É imperativo fazermos diferença no mundo, escrevendo a história da salvação na vida das pessoas e para isto, é imperioso resgatarmos a relevância da igreja no contexto sociocultural em que trilhamos a jornada da santificação.
Mas amados, a igreja só será relevante para o mundo e para o Reino, fazendo verdadeira diferença neste mundo com Agência reformadora de Deus, quando…
1. Estivermos preocupados com a vontade do Mestre e não com a nossa própria vontade – (Vs. 17).
Devemos evitar a visão antropocêntrica e buscarmos uma visão horizontal, cristocêntrica, cristológica e cristossímel.
“Onde queres” – Théleis, vontade ativa, soberana. A vontade decisiva e decisória de Deus onde não cabe relativizações ou negociatas, apenas a submissão.
Os anseios e vontades humanas desembocam sempre no hedonismo ou nas guerras cruentas e desumanas. Só a vontade de Deus para a igreja é “boa, agradável e perfeita”, Romanos 12.1.
Como Jesus, devemos admitir nossa humanidade em sua plenitude mas sempre orando: “não se faça a minha vontade, mas a tua”, Lucas 22.42.
2. Estivermos conscientes da brevidade do tempo da salvação – (Vs. 18).
O tempo da Deus é kairós, eterno, infinito, e não kronos, limitado, mensurado e controlado pelo homem, como se fossemos senhores do tempo.
Na dispensação da igreja, da graça salvadora, o tempo é sempre presente, é hoje, e a pregação deve ser levada a efeito “a tempo e fora de tempo”, 2 Timóteo 4.2.
Vale ressaltar a expressão “o Mestre diz”. Mestre, didáskalos, alguém que ensina revestido de capacidade, honra e dignidade. Jesus, sendo Deus, é Senhor do tempo e fala com autoridade quanto a brevidade do tempo para a pregação do evangelho. “Meu tempo está próximo”, diz o Mestre.
A Igreja não pode postergar a pregação. Não sabemos quando o Mestre voltará, Mateus 25.13. Estar preparados para adentrarmos com ele em sua glória implica em testemunho e pregação incessantes.
3. Nossos cultos se tornarem verdadeira celebração ao Cristo vivo, não à liturgia, à Denominação ou à Eclesiologia – (Vs. 18b e 19).
É imperioso buscarmos a consciência de libertação, Páscoa, e de celebração, de festa, de alegria e satisfação prezeirosa em nossos cultos, devido a presença do próprio Deus entre nós.
O texto não prevê sectarismo ou uniformidade. Não induz ao radicalismo ou ao êxtase emocional espiritualista esotericamente espiritualizado. Se quer, o texto aponta para um denominacionalismo desvairado e promotor de uma nefasta negligência ao que é bíblico em defesa de um hediondo tradicionalismo histórico-denominacional.
A festa, a Páscoa, era um memorial da libertação do Egito, da morte às mão do opressor, no sangue da remissão, Êxodo 12.14-17. Da mesma forma, nossos cultos devem ser verdadeira celebração pela e para salvação em Cristo. Uma festa alegre e vívida em gratidão pela libertação do pecado que nos é outorgada por Cristo.
Devemos buscar a consciência de que o Senhor está em seu trono de glória para receber de nós um culto “vivo, santo e agradável”, Romanos 12.1, resultado de mentes renovadas em Cristo no entendimento dos mistérios da salvação, 1 Coríntios 2.14-16.
Se perseguimos palco, apresentações e números especiais, ou se queremos vislumbrar os nossos olhos com feitos pitorescos ou com manifestações pneumotécnicas, aqui não é nosso lugar.
4. Somos contristados pela possibilidade de sermos o traidor – (Vs. 21 e 22).
Qual a nossa reação diante da expressão “um de vós me trairá”. Somos assolapados pela consciência de pecado que desemboca no arrependimento ou permanecemos insensíveis e nada nos impulsiona à santidade?
A expressão do verso 21, “me entregará”, no original, denota que Jesus bem sabia das intenções daqueles que o perseguiam. É assombroso que muitos crentes não sintam o sabor amargo de pecado como sentiram Moisés, Jacó, Isaías, Jeremias, Pedro, Paulo e muitos outros indicados no Texto Sagrado, insistindo nos passos de Caim e na decisão diabólica tomada por Judas Iscariotes, persistindo na traição.
Muitos, mesmo estando diante de Jesus e sendo desafiados ao arrependimento, não conseguem olhar para Jesus e identificá-lo com Senhor absoluto de todas as coisa, Kírios, admitindo-o apenas como rabi, mestre da lei, o que não é uma característica da personalidade de Jesus.
No culto verdadeiro Deus sempre manifesta sua glória, Isaías 6.1-8, e se nos dispomos à perfeita adoração, sempre somos levados à contrição e ao arrependimento, a fim de que dediquemos nossas vidas em perfeito louvor, evidenciado na proclamação do evangelho de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.
Retirar-se do culto sem experimentar restauração santificadora, permanecendo na inércia petrificada do comodismo, é constituir-se em traidor.
Em quinto e último lugar, afirmo que a igreja fará diferença no mundo e resgatará sua relevância e autoridade na pregação quando…
5. O sangue do pacto promover aliança de compromisso em nós – (Vs. 28).
Como igreja, se buscamos relevância para a sociedade, se pretendemos fazer a diferença já em nosso tempo, profetizando um futuro melhor, não podemos permanecer aguilhoados ao pelourinho do pecado e dissociados pelo preconceito que ressalta as idiossincrasias. Se somos igreja, devemos vivenciar íntima comunhão, irmanados em Jesus Cristo, Efésios 2.14-18 e 1 João 4.20.
O sangue do pacto foi derramado “para a remissão de pecados”, para cobrir e apagar o escrito de culpa que recaia sobre nós, Colossenses 2.14, para nos reconciliar com Deus, 2 Coríntios 5.18 e 19, fazendo-nos um só povo, Efésios 4.4 e conjugando-nos em só coração, Atos 4.32. Não divisionismo ou sectarismo autofágico e se quer, para um preconceito satanicamente beatificado pelo denominacionalismo coercitivo.
O sangue que “nos purifica de todo o pecado”, a partir do arrependimento e da confissão sincera diante de nosso Advogado e único mediador, Jesus Cristo, l João 1.8, 2.2 e 1 Timóteo 2.5, nos impõe a comunhão que afaga o coração e acarinha o aflito e o existencialmente desesperançado. Pelo que, a igreja deve retirar-se do templo, após o culto prestado, restaurada, perdoada, transbordando em amor e alegria e amalgamada no sangue de Jesus Cristo.
Todo o nosso pecado e preconceito devem ser abandonados aos pés da cruz de Cristo, o Cristo que “é tudo em todos”, Colossenses 3.11.
Conclusão
Amados, é urgente e premente uma reflexão quanto relevância e a atuação da igreja no mundo da globalização e, em especial, aqui em São Paulo.
Se não identificamos estas cinco assertivas em nossa expressão cúltica e identidade doutrinária e denominacional, corremos o risco de sermos vitimados por descomunal aridez teológica, eclesiológica e doutrinária. Nos tornaremos insipientes, insignificantes e dispensáveis ao homem que carece de salvação e não de liturgias, eventos sociais ou verdadeiros shows pseudo-espirituais aromatizados com essência de enxofre, não com o hálito do Espírito Santo.
Sejamos igreja. Corpo vivo de Cristo. Submissos a ordem do Mestre e conscientes da brevidade do tempo para a salvação. Sejamos igreja que festeja a vitória de Cristo na Cruz e que é contristada pela consciência de pecado. Sejamos igreja santa e poderosa na evangelização para que desfrutemos as benesses do perdão, do amor e da comunhão íntima, expressão inconteste da nossa reconciliação com Deus em Cristo Jesus.
Fernando Fernandes